..."A Minha Casa do Danúbio Azul" ...
Podia até podia ser uma casa qualquer, e ficar "registada" em mim como apenas uma casa onde morei.
Hoje contudo passo pela casa, e hoje ainda continuo a dizer "a minha casa".
Sim é verdade que os laços que me envolvem são sempre muito fortes. Por vezes pareço 8 ou 80, mas mantenho o que costumo dizer "sou muito fiel aos meus amores". E sou.
A casa, aquela casa, se tudo fosse escrito, pensado e dito acerca "da minha casa", muita tinta teria de correr.
Para já a tinta que corre é pouca e tão pouco estou a escrever com uma caneta de tinta permanente.
A casa da Valsa.
A casa do Danúbio Azul.
Coincidência apenas e só ser o azul a minha cor de eleição sendo que outrora foi o alvo branco...hoje de azul visto corpo e alma.
Música clássica, sou fã (qb), pouco conhecedora. Sou tal como alguém dizia terra a terra, e por vezes até dou por mim a pensar no geral da minha cultura geral.
Pouco me importa.
Strauss, óbvio que sim, a valsa do Danúbio azul, qualquer mortal conhece. Sendo eu mortal, conheço a imortal valsa que durante anos acompanhava o sonho de um dia casar e abrir a pista de dança ao som de Strauss.
Puro caranguejo, não só não houve casamento, como "a minha casa", já não é minha desde o tempo da outra senhora.
Mas "a minha casa", volta hoje ao meu presente, motivos que trarei quando assim entender.
Hoje volto ao tempo "da minha casa".
Ando quase 38 anos para trás...uma eternidade portanto.
Chego àquela casa com 5 meses, chego àquele palacete, porque ficava bem a um construtor civil ter uma casa assim, ficava bem a um presidente ou vice-presidente (não me recordo bem, irrelevante), de um clube ter uma casa assim.
Garagens?
Só garagens eram três, onde eram servidos almoços do clube, onde eram feitos bailes, onde era guardado um Mercedes branco (que ainda hoje trabalha na minha mente), numa das garagens (a última), sempre que chovia haviam infiltrações e podíamos andar de barco a remos lá dentro.
Verdade era uma casa grande, uma grande casa.
Nessas garagens foi passada a adolescência dos meus irmãos que tinham uma banda de música, os TNT eram uma banda da cidade, e eu a miúda que ouvia os ensaios e sempre que podia "jogava" a mão ao teclado (órgão entenda-se), tendo chegado mesmo a dar cabo de uma bateria. Sim nesta cabecinha tocar bateria com chave de fendas era do mais natural que podia haver.
Os TNT saíram do panorama musical, ficaram e tem o seu lugar na história da cidade. Hoje apenas o Ricardo Landum é reconhecido e conhecido no panorama musical (http://www.youtube.com/watch?v=zGp7LCAW9b8&feature=related).
Mas "a minha casa", deixou-me tantas marcas, basta ter chegado lá com 5 meses e saído de lá com 13 anos.
"A minha casa", onde também pequenina chegou uma serra da estrela com 5 semanas, que foi minha companheira de quase uma vida, quase porque para mim foi mesmo.
Quando deixei a casa, já o senhor construtor não fazia parte da casa havia anos, sendo tudo suportado pela Lena, um casarão como ela diz.
Mas dizia eu, a Nicha acabou por ir para a quinta do senhor construtor, sendo a primeira coisa que eu fazia quando lá chegava aos Domingos era ir vê-la.
Claro que um dia chego e é-me dito da forma mais natural (e cruel), que a Nicha tinha morrido. Aguentei-me até chegar a casa, em casa claro está as lágrimas foram mais do que muitas.
Hoje ainda mantenho na parede do meu quarto uma fotografia da Nicha.
Há daquela casa memórias, que serão sempre memórias, há marcas interiores, e exteriores.
O tempo esse sábio, tudo (ou quase tudo), cura.
Prefiro esquecer as marcas cruas e duras e lembrar-me dos bailes dos TNT os bailes de máscaras, pelo carnaval. Lembrar-me da Nicha a correr por aqueles corredores, deitada na relva com os gatos a dormirem em cima da sua barriga, numa paz única e digna de se ver. Os meus baloiços, o andar descalça pela terra, jogar à bola, ao berlinde (sim uma autêntica Maria rapaz). Olhar e ver a Lena no Mercedes branco, guardá-lo na garagem.
Certa vez ia-mos literalmente Arrábida abaixo, porque a Lena não gostava de meter o cinto de segurança, e o mesmo acabou por ficar preso no travão de mão. O meu avô que tinha vertigens olhou para o lado e acabou por desmaiar, a Lena manteve-se firme, com o Mercedes a patinar e a não querer sair do mesmo sitio, pouco mais me lembro só sei que teve de ser puxado por outro carro.
Costumava dizer que se me saísse o totoloto a voltaria a comprar, hoje com toda a certeza digo que não, tudo tem o seu tempo e aquele tempo passou.
"A minha casa", memórias...elas são memórias do ontem que num destes dias voltarão porque quis o destino que estivesse escrito que eu ia lá voltar a entrar.
O que vou sentir?
Não faço a mais pálida ideia, até porque falta a era que a envolvia as paredes, faltam-lhe as varandas de alumínio dourado (raro na altura), falta-lhe tanta, tanta coisa, que o mais certo é eu entrar lá e não me lembrar de nada.
E é aqui que a mim mesma digo "mentirosa"...
Verdade, é mentira porque sei que vou lá entrar e sentir um turbilhão de emoções, visões...
Mas eu vou lá entrar, e vou pensar como hoje...
Digam lá se a vida não é...
Tanta, tanta coisa?
Tanta, tanta coisa?
Maria.
(08-02-2012)
Beijo n´oteudoceolhar.